Kajuru: “Lava Toga vai abrir a caixa-preta dos tribunais”


Jorge Kajuru Gilmar Mendes entrevista senador

21/03/2019, QUINTA-FEIRA
Sua estreia no Senado Federal foi acachapante. Detentor de mais de 1,5 milhão de votos em Goiás, Jorge Kajuru, 58, roubou a cena ao revelar que, aos 11 anos, dedurou à mãe que o pai tinha uma amante. A intenção era defender o voto aberto na eleição à presidência da Casa, marcada pela sessão inaugural que terminou em bate-boca e troca de acusações entre parlamentares. “Foi uma noite sombria”, lembra Kajuru. Durante seu primeiro pronunciamento no plenário, ele ainda citou Ruy Barbosa: “Pouco se me dá que claudique a onagra, o que me apraz é acicatá-la”. Assim que encerra a fala, o ex-presidente e colega de Senado, Fernando Collor, se aproxima e pergunta o que ele quis dizer com a frase. “Ninguém entendeu. Tive que explicar: ‘Gente, a mim pouco importa que a mula manque, o que eu quero é rosetar’. Quero um pouco de felicidade, de bom humor.”
O estilo verborrágico que o notabilizou como apresentador de programas esportivos na televisão é uma marca que Kajuru estende à política. O que, por vezes, o faz bater de frente: a última dividida foi com o ministro Gilmar Mendes, a quem acusa de vender sentenças a políticos do PSDB — o ministro pediu ao STF que tome providências. Frasista incontrolável, ao falar sobre sua trajetória como jornalista, os planos no Senado e os vespeiros que pretende chacoalhar, ele dispara uma série de bordões que resumem a personalidade afeita aos assuntos mais polêmicos.
“A vida não é só sexo.”
“Sozinho, você não serve nem pra ser corno.”
“Que culpa eu tenho de ter cultura?”
“A ignorância é a maior multinacional do mundo.”
“O Brasil é pentacampeão mundial de hipocrisia.”
“Não sou dono da verdade. A verdade é dona de mim.”
“Merdas cagadas não voltam ao local de origem.”
Apesar de eruptivo, Kajuru rechaça o rótulo de personagem folclórico. “Sou um cara bem humorado, culto e poético. Eu li mais do que vivi: Dostoiévski, Trótski, Homero, Machado de Assis, Neruda, Clarice Lispector, Osho... Eu sei exatamente o meu tamanho. Quem me chama de folclórico é ignorante.” Se a impressão inicial havia sido negativa, o senador estreante agora se diz surpreso com o nível dos colegas em Brasília. “Comecei a ver inteligência, equilíbrio, tom moderador. Os novos senadores são absolutamente preparados. Sou respeitado pelos meus colegas e os respeito. Para discordar, não preciso desqualificar.”
Por outro lado, os hábitos espartanos de Kajuru têm chamado a atenção de seus pares. De segunda à sexta, ele chega às 6h50 ao Senado. Participa de todas as sessões e, eventualmente, também dá expediente aos sábados e domingos. No almoço, come um PF a 12 reais. “Minha dieta hoje é bem diferente da época em que eu pesava 120 quilos.” De seu gabinete, transmite a entrevista por telefone ao EL PAÍS em seus 30 perfis de rede social. Interrompe a conversa para repreender um funcionário que cochilava numa cadeira. “Professor Mulatinho? Tá dormindo? Eu aqui enchendo sua bola e vossa excelência dormindo na minha frente.” O auxiliar parlamentar em questão ajuda a compor os discursos e projetos de Kajuru, que se orgulha de ter três gurus, ex-senadores, à disposição de forma voluntária. Cristovam Buarque (“um Darcy Ribeiro da educação”), Pedro Simon (“não subo na tribuna sem antes falar com ele por 20 minutos”) e Heloísa Helena (“me auxilia na área da saúde”). Kajuru tem 15 assessores em Brasília e outros 10 no gabinete de Goiânia, menos da metade do número máximo de funcionários permitidos aos senadores. “Não precisa ter 55 assessores”, afirma. “Mas o que acontece na Suécia, onde parlamentar não tem assessor, é um exagero. Uma boa equipe é essencial para um bom mandato. Ninguém faz nada sozinho. Nosso Criador tinha quantos apóstolos?”.

Ele promete revirar “várias caixas-pretas” no Congresso Nacional. Na semana passada, Kajuru foi o primeiro a assinar o requerimento proposto por Alessandro Vieira (PPS-SE) para abertura da CPI da Lava Toga, que quer investigar supostos excessos cometidos em cortes superiores, como o Supremo Tribunal Federal (STF). “Existe muita coisa errada, muita sentença comprada... A Lava Toga vai abrir a caixa-preta dos tribunais. Cada ministro do STF tem mais de 200 funcionários e até auxílio-funeral. Isso é um absurdo”, diz o senador de Goiás, observando que as regalias do Legislativo também estão em sua mira. “Minha luta não é contra o Supremo, mas contra todo tipo de privilégio criminoso da máquina pública, incluindo a Câmara e o Senado.” Juntas, as duas casas consomem anualmente cerca de 10 bilhões de reais.
Kajuru afirma que tem feito sua parte para frear a sangria nos cofres públicos. Doa metade de seu salário (33.700 reais) a instituições sociais como o Cevam (Centro de Valorização da Mulher) ou pessoas físicas em dificuldade financeira, a exemplo do ex-jogador do Atlético-GO, Agnaldo, que foi presenteado com pernas mecânicas. “Não devolvo dinheiro para o ralo da corrupção”, justifica. Dispensa carros oficiais, passagens aéreas e auxílio-moradia. Em Brasília, alugou um flat a cinco minutos do Congresso e banca do próprio bolso o aluguel de 2.500 reais. “Quem achar que é demagogia, que também o faça. Que outros senadores abram mão de 50% do que custam.”
Do punho cerrado ao apoio a Bolsonaro
“Se a classe política abrir mão de privilégios e metade do salário, não precisa mexer na Previdência.” Assim, Jorge Kajuru diz acreditar que “cortes na carne” dos poderes Executivo e Legislativo podem representar “uma economia na casa de um trilhão”, suficiente para cobrir o déficit previdenciário estimado em 290 bilhões de reais. “Nosso salário é uma fortuna. Professor não chega nem perto de ganhar metade do que ganhamos.” A proposta de ajuste da Previdênciaapresentada pelo Governo de Jair Bolsonaro não lhe agrada. “A reforma é um tapa na cara de idosos e pessoas especiais. Ela protege caloteiros e prejudica a camada mais pobre da população, que só vai se aposentar se for como Raul Seixas, nascido há dez mil anos atrás.”
Por “caloteiros”, o senador entende empresas que devem à Previdência. Segundo seus cálculos, somente os cinco maiores bancos do país acumulam dívidas superiores a 2 bilhões de reais. Ele argumenta que o Governo deveria ter como prioridades “as reformas tributária, política e dos Estados, que estão endividados”. Embora se diga amigo do ministro da Economia, Paulo Guedes, descarta votar a favor da proposta governista caso não haja mudanças nas idades mínimas sugeridas para aposentadoria. “Não sou contra a reforma da Previdência, mas ela pode esperar. O maior crime do Brasil é a renúncia fiscal. Se Bolsonaro quiser pagar toda a dívida do Brasil, é só usar a riqueza do nióbio.
El País

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